Klango

sexta-feira, maio 02, 2008

Carta da mãe portuguesa ao filho militar

Meu Querido filho,
Ponho-te estas poucas linhas para saberes que estou viva. Escrevo devagar por que sei que não gostas de ler depressa.
Se receberes esta carta, é porque chegou. Se ela não chegar, avisa-me que mando-te outra.
Teu pai leu no jornal que a maioria dos acidentes ocorrem a 1 km de casa. Assim, mudamo-nos para mais longe.
Sobre o casaco que querias, o teu tio disse que seria muito caro mandar-to pelo correio por causa dos botões de ferro que pesam muito. Assim arranquei os botões e coloquei-os no bolso. Quando chegar aí, prega-os de novo.
No outro dia, houve uma explosão na botija de gás aqui na cozinha. O pai e eu fomos atirados pelo ar e caímos fora de casa. Que emoção: foi a primeira vez, em muitos anos, que o pai e eu saímos juntos.
Sobre o nosso cão, o Jolly, anteontem foi atropelado e tiveram de lhe cortar o rabo, por isso toma cuidado quando atravessares a rua.
Na semana passada, o médico veio visitar-me e colocou na minha boca um tubo de vidro. Disse para ficar com ele por duas horas sem falar. O teu pai ofereceu-se para comprar o tubo.
Sobre o pai: ele arranjou um bonito trabalho. Tem quase 500 pessoas debaixo dele. Agora é coveiro aqui no cemitério.
O teu primo, o Manoel, casou-se e agora reza todas as noites à esposa. É que ela é virgem e chama-se Maria.
O teu irmão Antônio deu-me muito trabalho hoje. Fechou o carro e deixou as chaves lá dentro. Tive que ir a casa, pegar a suplente para a abrir. Por sorte, cheguei antes de começar a chuva, pois a capota estava em baixo.
Se vires a Dona Esmeralda, diz-lhe que mando lembranças. Se não a vires, não digas nada.
Tua Mãe Maria
PS. Ia mandar-te 10 contos, mas quando me lembrei, já tinha fechado o envelope.

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